sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Na quebrada (e no cinema)






O filme Na Quebrada, dirigido por Fernando Grostein Júnior, conta a história de três jovens de Nova Brasilândia, uma favela de São Paulo, que acabam conhecendo o cinema por conta do trabalho de uma Ong, o Instituto Criar.As histórias e o filme em si não fogem muito do que vem sido mostrado em filmes de favela, quase um novo gênero.  Na verdade o filme veio para a comemoração de dez anos da Ong, sendo assim, cumpriu bem seu objetivo. Vamos a história e aos pontos fortes. 

O filme segue a trajetória dos quatro adolescentes: Júnior (Jean Luis Amorin), Joana (Daiana Andrade), Zeca (Felipe Simas, que segundo minha amiga faz Malhação, mas só fez eu recordar o Kayky Brito)  e Gerson (Jorge Dias, filho do Mano Brown). Júnior é o personagem engraçado e atrapalhado, que vive levando choques e quebrando as coisas (me lembrou eu mesma). Parece caricato, mas os depoimentos reais no final do filme mostram que essas pessoas existem mais na realidade do que na ficção. Joana é uma menina que esta grávida e tem pais cegos, vivendo o drama do seu irmão também estar ficando. Zeca tem que lidar com os pais no mínimo chatos porque quer se tornar um cineasta. Gerson tem a história mais complicada, com uma mãe solteira e o pai no presídio. A mãe leva drogas para o pai, até que ele morre e Gerson precisa entrar no mundo do crime para pagar dívidas. 

Zeca, por sinal, tem sua história baseada na trajetória do co-diretor do Filme, Paulo Eduardo, que foi marcado pela violência quando leva um tiro na adolescência. Ele se entusiasma com o cinema e cria uma sala dentro da comunidade, o Cine Rincão. Tudo isso está no filme. O Cine Rincão foi tema de um curta metragem que chegou ao Festival de Veneza, também dirigido por Grostein Júnior. Ele fez parte de um projeto da revista italiana Colors, que buscava curtas de pessoas que tinham sido baleadas em zonas de conflito pelo mundo. Entre 15 mil inscritos em todo o mundo, Cine Rincão ficou entre os 10 finalistas exibidos no Festival de Veneza de 2012. Ah, dado interessante: O Cine Rincão, o curta, tem a trilha sonora de Caetano Veloso e também de Lucas Lima (da Família Lima, sabe? Que casou com a Sandy. Do Sandy e Júnior, lembra?). Lima também participou da trilha sonora do Na Quebrada. 




O que todos eles tem em comum é que moram em Brasilândia e acabam num curso de Cinema, do Instituto Criar. Até aí um filme é, vai, nota C. Porém, o que chamou a minha atenção foi a ÓTIMA atuação daqueles que fazem papel de presos no filme, especialmente o pai de Gerson, interpretado por Anderson Lima. A situação foi explicada no final, quando é mostrado que os presos que participaram do filme são presos ou ex-presos reais. Eles são parte de um grupo de teatro Do Lado de Cá, que realiza atividades artísticas dentro da Penitenciária Desembargador Adriano Marrey, em Guarulhos, SP. Isso é simplesmente genial. Incluir os presidiários num grupo desses já seria interessante o suficiente, mas contar com a ajuda deles num filme como esse é ainda mais importante, tanto para sua valorização como para reintegração. 

O filme é dirigido por Fernando Grostein Andrade que já fez trabalhos muito bons. Ele dirigiu Quebrando o Tabu (se você ainda não viu esse filme, para tudo e vai aqui, ó.), que fala sobre a política de combate às drogas no Brasil e em vários países do mundo. Ele também é diretor de Coração Vagabundo, que tenho certeza que é muito bom, mesmo não tendo visto, haha. O documentário sobre o Caetano Veloso (vou dar um S2 aqui) está no topo da minha lista para coisas urgentes a serem assistidas. Ele traz o cotidiano da turnê do disco A Foreign Sound, o único disco de Veloso gravado em inglês. 

O engraçado é que Fernando Grostein Andrade, filho de Mário Andrade, é meio-irmão de Luciano Huck, fundador da Ong. O histericamente engraçado, para mim, é que Luciano Huck apoiou com afinco a candidatura de Aécio Neves na corrida presidencial deste lindo ano de 2014. Justamente Aécio, que é a favor da redução da maioridade penal, o que levaria mais crianças e adolescentes das periferias para o sistema prisional tão bem retratado no filme: violento, superlotado, que dá poucas chances de recuperação. 

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