"Eles Voltam" estreia na próxima sexta-feira, dia 7 de março. O título promete, mas bem, acontece que eles não voltaram. A história conta a trajetória de Cris, que depois de uma briga com o irmão, é deixada na estrada pelos pais. Depois de perceberem que os pais não vão voltar, o irmão sai para procurar ajuda. Cris continua no meio da estrada do interior, esperando. Até que vê que ninguém vai voltar, e segue, meio que sem rumo, em frente. No começo, nem dá para saber se ela realmente quer voltar para casa ou não, tamanho seu silêncio e aceitação.
Ela é ajudada por um adolescente que mora em um acampamento do MST, o que contrasta incrivelmente com sua origem de classe média de Recife. O que constrói o filme são essas contradições brasileiras que todo mundo sabe que existe, mas poucas pessoas presenciam. Quantos, provenientes da classe média urbana, já estiveram em um acampamento do MST?
É interessante também a retomada do cinema nordestino, especialmente quando se vive no pólo Rio-São Paulo. Ir no cinema e ver um outro tipo de Brasil, de brasileiro é simplesmente bonito. Pensamos no Brasil e encarnamos os cariocas como brasileiros, esquecendo que num país com mais de sete milhões de metros quadrados e mais de 200 milhões de pessoas, ser carioca é ser do Rio, e não ser do Brasil. Rio e São Paulo englobam pouco mais de 30 milhões. São 170 milhões espalhados pelo resto do território, fazendo cultura, festa e cinema, de um jeito diferente. E tão pouco chega até nós! Acabamos nos acostumando com a produção do mesmo, com os mesmos sotaques, os mesmos problemas, as mesmas belezas. E ninguém parece perceber. Até tomarmos uma porrada na cara, como foi O som ao redor. E a partir disso, outros empurrões, como Cine Holliúdiy e, agora, Eles Voltam.
Maria Luiza Tavares, encarnando Cris, de 12 anos, tem um sotaque encantador, assim como Elayne de Souza, uma amiga da família que ela finalmente encontra depois de certo tempo. O diretor do filme, Marcello Lordello, escolheu, no seu filme de estreia, trabalhar com não-atores. Essencial. Impossível para um ator ter as rugas e os trejeitos da mãe do menino do MST, que socorre Cris. Talvez impossível alguém interpretar a passividade de Cris, que parece ser mesmo é de Maria Luiza. Em entrevista, Marcello disse que quis não atores depois de assistir Iracema, uma Transa Amazônica, do Orlando Senna e do Jorge Bodanzky e Os Incompreendidos, de Truffaut,.
Interessante também a trajetória do irmão não ser mencionada. Interessante e acertado. Cris é o centro, não porque é protagonista, mas porque é uma das protagonistas de inúmeras histórias. A impressão é que cada personagem daria um filme. A beleza natural de Elayne, sua história de jovem meio perdida, a intelectualidade brasileira em meio a pós graduação, drogas e amores sem jeito poderiam dar outro filme (por favor!). Sem contar as filhas da senhora do MST que, num segundo momento, ajuda Cris. Como será a vida dessas meninas do interior, do MST, que ajudam a mãe como faxineira, mas querem fazer faculdade em outra cidade?
O filme vale a pena pelos sotaques, pela beleza das cenas e pelo silêncio, que as vezes é difícil de encontrar na dose certa. Que mais gente do nordeste chegue até o circuito nacional. E mais gente do sul, centro-oeste, norte... Mais uma vez penso no dia que todos as salas de um cinema serão ocupados por filmes nacionais, não seria tão bonito?
E vida longa ao cinema nacional que "pensa fora da caixa". O cinema nordestino, em especial o pernambucano, é o principal cartaz da cinematografia nacional já há algum tempo e produções como "Eles voltam" sinalizam que esse paradigma deve ser mantido por algum tempo.
ResponderExcluirBjs